
A pessoa que obtem poder político tende a usá-lo em benefício próprio. Mesmo que as pessoas e as normas da sociedade não permitam, há uma tendência a surgir a corrupção. O poder político, mesmo não sendo absoluto, tende a corromper.
Em uma primeira acepção, o verbo "corromper" tem um sentido mais amplo que a prática pura e simples de corrupção política. Neste primeiro sentido, o verbo “corromper” significa a transformação - danosa para a sociedade - da personalidade da pessoa alçada à posição de exercer poder sobre os demais cidadãos (que antes desta transformação danosa eram considerados, pela normas escritas e não escritas, seus iguais).
Há uma frase famosa em teoria política cuja análise pode ajudar a aclarar este conceito. Lord Acton afirmou que “O poder tende a corromper - e o poder absoluto corrompe absolutamente". Com essa afirmação sobre o poder político, Lord Acton disse que a autoridade política, nas sociedades humanas, em função apenas e tão somente de sua existência tende a danificar as relações entre seres inicialmente dotados de igualdade.
Inicialmente, "o poder tende a corromper" porque o poder político faz de seu detentor uma pessoa diferente das demais cercando-a de símbolos, distinções, privilégios e imunidades que sinalizam sua hierarquia superior. Por exemplo, regras de cerimonial regulamentam qual deve ser o comportamento das pessoas inferiores na presença da autoridade (quais gestos de deferência e respeito são devidos, por exemplo). Com o passar do tempo, ocorre uma transformação do indivíduo privado em uma autoridade pública que usa o poder em benefício privado. É dentro desta metamorfose que ocorre a corrupção do poder político de que fala Lord Acton.
A segunda parte da afirmação de Lord Acton diz que o poder absoluto corrompe absolutamente quem o exerce. A demonstração de que o poder político absoluto é intrinsecamente e totalmente corruptor foi cabalmente feita pelo exercício do poder totalitário pelos nazismo alemão e pelo stalinismo comunista russo. Estas formas de poder político eurasiano do século XX levaram ao limite o conceito do poder político absoluto . Mesmo reis e imperadores que governaram a Europa entre os séculos XV e XIX não atingiram os limites de brutalidade, arbitrariedade e destruição do tecido social que estes sistemas totalitários.
Taambém é possível dizer que a afirmação de Lord Acton é uma racionalização moderna da frase que o escravo encarregado de segurar a coroa de louros sobre a cabeça do general romano vitorioso deveria pronunciar, repetidamente, ao seu ouvido, durante a cerimônia do "triunfo" (homenagem que os cidadãos romanos a ele prestavam quando entrava em Roma desfilando à frente a seu exército): "Não te esqueças que és humano".
A relação inversa existente entre liberdade do indivíduo e organização da sociedade
A teoria prática ocidental, ao tratar de como conciliar liberdade e capacidade de organização social, implicitamente coloca o problema do controle das pessoas por uma pessoa (ou grupo de pessoas). Isto é, o problema da política pode ser resumido em como uma pessoa (ou um grupo de pessoas) obtém o controle sobre as demais pessoas da sociedade.
O poder sobre os outros necessita de uma legitimação e essa legitimação é geralmente configurada por uma doutrina. Os preceitos jurídicos, políticos, religiosos, de sentimento nacional, de sentimento de classe social e de partido político são os principais exemplos de critérios de uma tal legitimação sobre a soberania da vontade das outras pessoas da sociedade.
Sem essa doutrina (que confere lógica a esses preceitos sociais), o uso e o abuso do poder se torna insuportável. A essa doutrina dá-se o nome de autoridade do Estado . O Estado é definido por Max Weber como a estrutura social que detém o monopólio do uso legítimo da força - no sentido de "uso ou ameaça de uso da punição física” - sobre as pessoas de uma determinada população que vive dentro de um território definido para garantir que elas respeitem as leis e normas sociais. Para uma idéia do tamanho deste poder basta afirmar que ele chega a exigir a vida dos cidadãos submetidos a ele (por exemplo através da pena de morte ou da exigência de defender seus limites territoriais em caso de guerra com outros Estados).
Embora o ditador - ou tirano – tenha uma personalidade demonstrada plenamente pelos totalitarismos modernos, ele já foi analisado pelos autores clássicos. Em sua teoria política, Paltão mostra a ditadura como a pior forma de governo. No livro "República”, ele mostra como o tirano obtém o poder através da manipulação das massas ingênuas e de como prende, exila e assassina adversários, com o objetivo de transformar o poder político relativo dado pela sociedade em poder absoluto.
Durante este processo de obtenção do poder político absoluto, Platão mostra como o tirano substitui as pessoas de qualidade que o ajudaram a chegar ao poder por pessoas corruptas e assassinas. Ele também cria uma guarda pessoal que tortura e mata sob suas ordens ou de outras pessoas da hieraquia que ele cria. Finalmente, Platão mostra como o tirano recorre a guerras para distrair a atenção do povo de sua ação nefasta com o objetivo de continuar a exercer o poder político.
A imperfeição humana como causa do surgimento da corrupção.
Como vimos, em termos políticos, a corrupção surge no mesmo momento em que o detentor do poder do Estado passa a considerar os privilégios, os benefícios e as homenagens inerentes ao cargo como se dirigidos à sua pessoa. Tais privilégios, distinções, imunidades e deferências referem-se ao cargo e não à pessoa que o ocupa no momento.