Uma dúvida muito comum no cotidiano é querermos saber se todos temos a nossa alma gêmea, aquela metade eterna que viria completar e tornar nossa existência mais feliz e agradável. Como se vê, a teoria das almas gêmeas é um tema polêmico e delicado, principalmente agora que muitos livros, novelas, músicas e filmes tentam resolver os problemas dos solitários e dos casados infelizes.
No livro O Consolador Emmanuel disse, entre outras coisas, que cada coração possui no infinito “a alma gêmea da sua, companheira divina para a viagem gloriosa à imortalidade”, porque, “criadas umas para as outras, as almas gêmeas se buscam, sempre que separadas. A união é-lhes a aspiração suprema e indefinível. Milhares de seres, se transviados no crime ou na inconsciência, experimentam a separação das almas que os sustentam, como a provação mais ríspida e dolorosa, e, no drama das existências mais obscuras, vemos sempre a atração eterna das almas que se amam mais intimamente, evolvendo umas paras as outras, num turbilhão de ansiedades angustiosas, atração que é superior a todas as expressões convencionais da vida terrestre. Quando se encontram, no acervo dos trabalhos humanos, sentem-se de posse da felicidade real para os seus corações — a da ventura de sua união, pela qual não trocariam todos os impérios do mundo, e a única amargura que lhes empana a alegria é a perspectiva de uma nova separação pela morte, perspectiva essa que a luz da Nova Revelação veio dissipar, descerrando para todos os espíritos, amantes do bem e da verdade, os horizontes eternos da vida.”
Mas essas colocações de Emmanuel sobre a teoria das almas gêmeas parecem conflitar com o pensamento de Allan Kardec exposto na Revista Espírita de maio de 1858, em matéria com o título Metades eternas e referente a uma passagem de uma carta de um assinante cuja esposa havia falecido, deixando seis filhos. Sentindo-se em completo isolamento, o viúvo, ouvindo falar das manifestações espíritas, passou a freqüentar um grupo que praticava a mediunidade, aprendendo então que a verdadeira vida não está na Terra, mas no mundo dos Espíritos.
Certa noite, comunicando-se com o Espírito de sua esposa, perguntou-lhe a razão das divergências que tiveram durante a sua vida em comum, respondendo-lhe a antiga companheira que, malgrado tivessem passado alguns momentos felizes, não eram metades eternas, uma vez que tais uniões são raras na Terra, embora em alguns casos possam acontecer, quando representam um grande favor de Deus e aqueles que desfrutam essa felicidade experimentam alegrias indescritíveis.
Atendendo então ao pedido de esclarecimento formulado pelo missivista e também para sua própria instrução, Kardec dirigiu ao Espírito São Luís algumas perguntas, que depois foram inseridas em O Livro dos Espíritos, através das quais aquela entidade assevera, entre outros detalhes, que não existe uma união particular e fatal de duas almas. Existe a união entre todos os Espíritos, mas em graus diferentes, segundo a posição que ocupam, isto é, segundo a perfeição adquirida: quanto mais perfeitos, mais unidos. Da discórdia brotam todos os males humanos e da concórdia a felicidade completa.
Questionado sobre eventual contradição entre as suas ponderações acerca da teoria das almas gêmeas e as colocações de Allan Kardec sobre as metades eternas, feitas a partir das lições de São Luís, o Espírito Emmanuel, sempre por intermédio de Chico Xavier, asseverou que a tese é “... mais complexa do que parece ao primeiro exame, e sugere mais vasta meditação às tendências do século, no capítulo do ‘divorcismo’ e do ‘pansexualismo’, que a ciência menos construtiva vem lançando nos espíritos, mesmo porque, com a expressão ‘almas gêmeas’, não desejamos dizer ‘metades eternas’, e ninguém, a rigor, pode estribar-se no enunciado para desistir de veneráveis compromissos assumidos na escola redentora do mundo, sob pena de aumentar os próprios débitos, com difíceis obrigações à frente da Lei.”
De qualquer forma, ficamos com a seguinte conclusão de Kardec:“A teoria das metades eternas é uma figura referente à união de dois Espíritos simpáticos; é uma expressão usada mesmo na linguagem comum, tratando-se dos esposos, o que não se deve tomar ao pé da letra. Os Espíritos que dela se serviram certamente não pertencem à mais alta ordem: a esfera de seus conhecimentos é necessariamente limitada e eles exprimiram o pensamento em termos de que se teriam servido na vida corpórea. É, pois, necessário rejeitar esta idéia de que dois Espíritos, criados um para o outro, uma dia deverão unir-se na eternidade, depois de terem estado separados durante um lapso de tempo mais ou menos longo.”
Eliseu F. Motta Jr
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