Bertolt Brecht(Poeta e dramaturgo alemão)10-2-1898, Augsburgo 14-8-1956, Berlim Oriental
Eugen Berthold Friedrich Brecht é um dos autores alemães mais importantes do século XX, especialmente nas suas facetas de dramaturgo e de poeta. De formação marxista, Bertolt Brecht (seu nome artístico) dava grande importância à dimensão pedagógica das suas obras de teatro: contrário à passividade do espectador, sua intenção era formar e estimular o pensamento crítico do público. Para isso, servia-se de efeitos de distanciamento, como máscaras, entreatos musicais ou painéis nos quais se comentava a ação. Brecht expôs em escritos de caráter teórico e encenações modelares essa nova forma de entender o teatro. O reconhecimento de sua genialidade chegou muito depressa: em 1922, foi concedido ao jovem Brecht o prêmio Kleist por Tambores da Noite. No entanto, no princípio dedicou-se à assessoria artística, trabalhando, por exemplo, para o Teatro Alemão de Berlim, de Max Reinhard, entre 1924 e 1926. Brecht consolidou-se como escritor independente logo após os musicais Ópera dos Três Vinténs (1928) – que bem mais tarde inspiraria a Ópera do Malandro, do brasileiro Chico Buarque de Holanda – e Ascensão e Queda da Cidade de Mahagonny (1930), escritos em colaboração com o compositor Kurt Weil. A crítica social contida nessas obras e seu humor cínico causaram escândalo na República de Weimar alemã. A ascensão ao poder dos nazistas marcou o início de uma longa odisséia para Brecht, que, no final, o conduziu à Califórnia, onde permaneceu até o final da guerra e onde escreveu muitas das suas famosas obras teatrais: Galileu Galilei (1938), que aborda a responsabilidade da ciência, dando três pontos de vista distintos nas suas três versões; a peça antibelicista Mãe Coragem (1939); A Boa Pessoa de Setzuan (1941). Em colaboração com Lion Feuchtwanger, em As Visões de Simone Machard, transportou para a época da Segunda Guerra Mundial o mito de Joana d´Arc, personagem que já tinha abordado em 1930 em Santa Joana dos Matadouros, que só estreou em 1959. A obra contra Hitler, A Ascensão Irresistível de Arturo Ui, escrita no exílio na Finlândia, em 1941, só estreou depois da morte de Brecht. Após o regresso à Alemanha Oriental, fundou –- e, a partir de 1949, dirigiu, conjuntamente com sua mulher –- o Berliner Ensemble, onde se encenavam principalmente suas obras. Tal como as peças de teatro, a obra lírica de Brecht, publicada em quatro coleções, contém uma importante carga de crítica política e de ironia, embora também tenha composto poemas de amor muito pessoais. São especialmente conhecidas as Histórias do Sr. Keuner, coleção de breves episódios, que escreveu desde 1930 até a sua morte e foi publicada em 1958.Ajude a deixar este site mais completo, compartilhe seu conhecimento.
Textos
Bertold Brecht
Poemas de Bertold Brecht
Os que lutam
"Há aqueles que lutam um dia; e por isso são muito bons;
Há aqueles que lutam muitos dias; e por isso são muito bons;
Há aqueles que lutam anos; e são melhores ainda;
Porém há aqueles que lutam toda a vida; esses são os imprescindíveis."
O Analfabeto Político:
O pior analfabeto é o analfabeto político.
Ele não ouve, não fala, nem participa dos acontecimentos políticos.
Ele não sabe que o custo de vida, o preço do feijão,
do peixe, da farinha, do aluguel, do sapato e do remédio
dependem das decisões políticas.
O analfabeto político é tão burro que se orgulha e estufa o peito dizendo que odeia
a política. Não sabe o imbecil que da sua ignorância política nasce a prostituta,
o menor abandonado, e o pior de todos os bandidos que é o político vigarista,
pilantra, o corrupto e lacaio dos exploradores do povo.
Nada é impossível de Mudar :
"Desconfiai do mais trivial, na aparência singelo.
E examinai, sobretudo, o que parece habitual.
Suplicamos expressamente: não aceiteis o que é de
hábito como coisa natural, pois em tempo de desordem
sangrenta, de confusão organizada, de arbitrariedade consciente,
de humanidade desumanizada, nada deve parecer natural
nada deve parecer impossível de mudar."
Privatizado
"Privatizaram sua vida, seu trabalho, sua hora de amar e seu direito de pensar.
É da empresa privada o seu passo em frente,
seu pão e seu salário. E agora não contente querem
privatizar o conhecimento, a sabedoria,
o pensamento, que só à humanidade pertence."
SOBRE A VIOLÊNCIA
A corrente impetuosa é chamada de violenta
Mas o leito do rio que a contem
Ninguém chama de violento.
A tempestade que faz dobrar as betulas
É tida como violenta
E a tempestade que faz dobrar
Os dorsos dos operários na rua?
DAS ELEGIAS DE BUCKOW
Viesse um vento
Eu poderia alçar vela.
Faltasse vela
Faria uma de pano e pau. FERRO.
No sonho esta noite
Vi um grande temporal.
Ele atingiu os andaimes
Curvou a viga
A feita de ferro.
Mas o que era de madeira
Dobrou-se e ficou.
SE FÔSSEMOS INFINITOS
Fossemos infinitos
Tudo mudaria
Como somos finitos
Muito permanece.
QUEM SE DEFENDE
Quem se defende porque lhe tiram o ar
Ao lhe apertar a garganta, para este há um parágrafo
Que diz: ele agiu em legitima defesa. Mas
O mesmo parágrafo silencia
Quando vocês se defendem porque lhes tiram o pão.
E no entanto morre quem não come, e quem não come o suficiente
Morre lentamente. Durante os anos todos em que morre
Não lhe é permitido se defender.
PERGUNTAS DE UM TRABALHADOR QUE LÊ
Quem construiu a Tebas de sete portas?
Nos livros estão nomes de reis.
Arrastaram eles os blocos de pedra?
E a Babilônia varias vezes destruída--
Quem a reconstruiu tanta vezes? Em que casas
Da Lima dourada moravam os construtores?
Para onde foram os pedreiros, na noite em que
a Muralha da China ficou pronta?
A grande Roma esta cheia de arcos do triunfo
Quem os ergueu? Sobre quem
Triumfaram os Cesares? A decantada Bizancio
Tinha somente palácios para os seus habitantes? Mesmo
na lendária Atlântida
Os que se afogavam gritaram por seus escravos
Na noite em que o mar a tragou.
O jovem Alexandre conquistou a Índia.
Sozinho?
César bateu os gauleses.
Não levava sequer um cozinheiro?
Filipe da Espanha chorou, quando sua Armada
Naufragou. Ninguém mais chorou?
Frederico II venceu a Guerra dos Sete Anos.
Quem venceu alem dele?
Cada pagina uma vitoria.
Quem cozinhava o banquete?
A cada dez anos um grande Homem.
Quem pagava a conta?
Tantas histórias.
Tantas questões.
EU SEMPRE PENSEI
E eu sempre pensei: as mais simples palavras
Devem bastar. Quando eu disser como é
O coração de cada um ficara dilacerado.
Que sucumbiras se não te defenderes
Isso logo veras.
NÃO NECESSITO DE PEDRA TUMULAR
Não necessito de pedra tumular, mas
Se necessitarem de uma para mim
Gostaria que nela estivesse:
Ele fez sugestões
Nós as aceitamos.
Por tal inscrição
Estaríamos todos honrados.
LENDO HORACIO
Mesmo o diluvio
Não durou eternamente.
Veio o momento em que
As águas negras baixaram.
Sim, mas quão poucos
Sobreviveram!
EPITÁFIO PARA GORKI
Aqui jaz
O enviado dos bairros da miséria
O que descreveu os atormentadores do povo
E aqueles que os combateram
O que foi educado nas ruas
O de baixa extração
Que ajudou a abolir o sistema de Alto a Baixo
O mestre do povo
Que aprendeu com o povo.
NA MORTE DE UM COMBATENTE DA PAZ
À memória de Carl von Ossietzky
Aquele que não cedeu
Foi abatido
O que foi abatido
Não cedeu.
A boca do que preveniu
Está cheia de terra.
A aventura sangrenta
Começa.
O túmulo do amigo da paz
É pisoteado por batalhões.
Então a luta foi em vão?
Quando é abatido o que não lutou só
O inimigo
Ainda não venceu.
A MÁSCARA DO MAL
Em minha parede há uma escultura de madeira japonesa
Máscara de um demônio mau, coberta de esmalte dourado
Copreensivo observo
As veias dilatadas da fronte, indicando
Como é cansativo ser mal
REFLETINDO SOBRE O INFERNO
Refletindo, ouço dizer, sobre o inferno
Meu irmão Shelley achou ser ele um lugar
Mais ou menos semelhante a Londres. Eu
Que não vivo em Londres, mas em Los Angeles
Acho, refletindo sobre o inferno, que ele deve
Assemelhar-se mais ainda a Los Angeles.
Também no inferno
Existem, não tenho dúvidas, esses jardins luxuriantes
Com as flores grandes como árvores, que naturalmente fenecem
Sem demora, se não são molhadas com água muito cara.
E mercados de frutas
Com verdadeiros montes de frutos,no entanto
Sem cheiro nem sabor.E intermináveis filas de carros
Mais leves que suas próprias sombras,mais rápidos
Que pensamentos tolos,autómoveis reluzentes,nos quais
Gente rosada,vindo de lugar nenhum,vai a nenhum lugar.
E casas construídas para pessoas felizes,portanto vazias
Mesmo quando habitadas.
Também as casas do inferno não são todas feias
Mas a preocupacão de serem lançados na rua
Consome os moradortes das mansões nao menos que
Os moradores do barracos.
NA GUERRA MUITAS COISAS CRESCERÃO
Ficarão maiores
As propriedades dos que possuem
E a miséria dos que não possuem
As falas do guia*
E o silêncio dos guiados.
* FührerCOMO BEM SEI
Como bem sei
Os impuros viajam para o inferno
Através do céu inteiro.
São levados em carruagens transparentes:
Isto embaixo de vocês, lhe dizem
É o céu.
Eu sei que lhes dizem isso
Pois imagino
Que justamente entre eles
Há muitos que não o reconheceriam, pois eles
Precisamente
Imaginavam-no mais radiante
JAMAIS TE AMEI TANTO
Jamais te amei tanto, ma soeur
Como ao te deixar naquele pôr do sol
O bosque me engoliu, o bosque azul, ma soeur
Sobre o qual sempre ficavam as estrelas pálidas
No Oeste.
Eu ri bem pouco, não ri, ma soeur
Eu que brincava ao encontro do destino negro -
Enquanto os rostos atrás de mim lentamente
Iam desaparecendo no anoitecer do bosque azul.
Tudo foi belo nessa tarde única, ma soeur
Jamais igual, antes ou depois -
É verdade que me ficaram apenas os pássaros
Que à noite sentem fome no negro céu.
A MINHA MÃE
Quando ela acabou, foi colocada na terra
Flores nascem, borboletas esvoejam por cima...
Ela, leve, não fez pressão sobre a terra
Quanta dor foi preciso para que ficasse tão leve!
TAMBÉM O CÉU
Também o céu às vezes desmorona
E as estrelas caem sobre a terra
Esmagando-a com todos nós.
Isto pode ser amanhã.
O NASCIDO DEPOIS
Eu confesso: eu
Não tenho esperança.
Os cegos falam de uma saída. Eu Vejo.
Após os erros terem sido usados
Como última companhia, à nossa frente
Senta-se o Nada.
EPÍSTOLA SOBRE O SUICÍDIO
Matar-se
É coisa banal.
Pode-se conversar com a lavadeira sobre isso.
Discutir com um amigo os prós e os contras.
Um certo pathos, que atrai
Deve ser evitado.
Embora isto não precise absolutamente ser um dogma.
Mas melhor me parece, porém
Uma pequena mentira como de costume:
Você está cheio de trocar a roupa de cama, ou melhor
Ainda:
Sua mulher foi infiel
(Isto funciona com aqueles que ficam surpresos com essas coisas
E não é muito impressionante)
De qualquer modo
Não deve parecer
Que a pessoa dava
Importância demais a si mesmo
UM HOMEM PESSIMISTA
Um homem pessimista
É tolerante.
Ele sabe deixar a fina cortesia desmanchar-se na língua
Quando um homem não espanca uma mulher
E o sacrifício de uma mulher que prepara café para seu amado
Com pernas brancas sob a camisa -
Isto o comove.
Os remorsos de um homem que
Vendeu o amigo
Abalam-no, a ele que conhece a frieza do mundo
E como é sábio
Falar alto e convencido
No meio da noite.
SOUBE
Soube que
Nas praças dizem de mim que durmo mal
Meus inimigos, dizem, já estão assentando casa
Minhas mulheres põem seus vestidos bons
Em minha ante-sala esperam pessoas
Conhecidas como amigas dos infelizes.
Logo
Ouvirão que não como mais
Mas uso novos ternos
Mas o pior é: eu mesmo
Observo que me tornei
Mais duro com as pessoas.
QUEM NÃO SABE DE AJUDA
Como pode a voz que vem das casas
Ser a da justiça
Se os pátios estão desabrigados?
Como pode não ser um embusteiro aquele que
Ensina os famintos outras coisas
Que não a maneira de abolir a fome?
Quem não dá o pão ao faminto
Quer a violência
Quem na canoa não tem
Lugar para os que se afogam
Não tem compaixão.
Quem não sabe de ajuda
Que cale.
ACREDITE APENAS
Acredite apenas no que seus olhos vêem e seus ouvidos
Ouvem!
Também não acredite no que seus olhos vêem e seus
Ouvidos ouvem!
Saiba também que não crer algo significa algo crer!
COM CUIDADO EXAMINO
Com cuidado examino
Meu plano: ele é
Grande, ele é
Irrealizável.
OS ESPERANÇOSOS
Pelo que esperam?
Que os surdos se deixem convencer
E que os insaciáveis
Lhes devolvam algo?
Os lobos os alimentarão, em vez de devorá-los!
Por amizade
Os tigres convidarão
A lhes arrancarem os dentes!
É por isso que esperam!
NO SEGUNDO ANO DE MINHA FUGA
No segundo ano de minha fuga
Li em um jornal, em língua estrangeira
Que eu havia perdido minha cidadania.
Não fiquei triste nem alegre
Ao ver meu nome entre muitos outros
Bons e maus.
A sina dos que fugiam não me pareceu pior
Do que a sina dos que ficavam.
PARA LER DE MANHÃ E À NOITE
Aquele que amo
Disse-me
Que precisa de mim.
Por isso
Cuido de mim
Olho meu caminho
E receio ser morta
Por uma só gota de chuva.
DE QUE SERVE A BONDADE
1
De que serve a bondade
Se os bons são imediatamente liquidados, ou são liquidados
Aqueles para os quais eles são bons?
De que serve a liberdade
Se os livres têm que viver entre os não-livres?
De que serve a razão
Se somente a desrazão consegue o alimento de que todos necessitam?
2
Em vez de serem apenas bons, esforcem-se
Para criar um estado de coisas que torne possível a bondade
Ou melhor: que a torne supérflua!
Em vez de serem apenas livres, esforcem-se
Para criar um estado de coisas que liberte a todos
E também o amor à liberdade
Torne supérfluo!
Em vez de serem apenas razoáveis, esforcem-se
Para criar um estado de coisas que torne a desrazão de um indivíduo
Um mau negócio.
A Cruz de Giz
Eu sou uma criada. Eu tive um romance
Com um homem que era da SA.
Um dia, antes de ir
Ele me mostrou, sorrindo, como fazem
Para pegar os insatisfeitos.
Com um giz tirado do bolso do casaco
Ele fez uma pequena cruz na palma da mão.
Ele contou que assim, e vestido à paisana
anda pelas repartições do trabalho
Onde os empregados fazem fila e xingam
E xinga junto com eles, e fazendo isso
Em sinal de aprovação e solidariedade
Dá um tapinha nas costas do homem que xinga
E este, marcado com a cruz branca
é apanhado pela SA. Nós rimos com isso.
Andei com ele um ano, então descobri
Que ele havia retirado dinheiro
Da minha caderneta de poupança.
Havia dito que a guardaria para mim
Pois os tempos eram incertos.
Quando lhe tomei satisfações, ele jurou
Que suas intenções eram honestas. Dizendo isso
Pôs a mão em meu ombro para me acalmar.
Eu corri, aterrorizada. Em casa
Olhei minhas costas no espelho, para ver
Se não havia uma cruz branca.
As margens
Do rio que tudo arrasta se
diz que é violento
Mas ninguém diz violentas as
margens que o comprimem
O Vosso tanque General, é um carro forte
Derruba uma floresta esmaga cem
Homens,
Mas tem um defeito
- Precisa de um motorista
O vosso bombardeiro, general
É poderoso:
Voa mais depressa que a tempestade
E transporta mais carga que um elefante
Mas tem um defeito
- Precisa de um piloto.
O homem, meu general, é muito útil:
Sabe voar, e sabe matar
Mas tem um defeito-
Sabe pensar
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Eugen Berthold Friedrich Brecht é um dos autores alemães mais importantes do século XX, especialmente nas suas facetas de dramaturgo e de poeta. De formação marxista, Bertolt Brecht (seu nome artístico) dava grande importância à dimensão pedagógica das suas obras de teatro: contrário à passividade do espectador, sua intenção era formar e estimular o pensamento crítico do público. Para isso, servia-se de efeitos de distanciamento, como máscaras, entreatos musicais ou painéis nos quais se comentava a ação. Brecht expôs em escritos de caráter teórico e encenações modelares essa nova forma de entender o teatro. O reconhecimento de sua genialidade chegou muito depressa: em 1922, foi concedido ao jovem Brecht o prêmio Kleist por Tambores da Noite. No entanto, no princípio dedicou-se à assessoria artística, trabalhando, por exemplo, para o Teatro Alemão de Berlim, de Max Reinhard, entre 1924 e 1926. Brecht consolidou-se como escritor independente logo após os musicais Ópera dos Três Vinténs (1928) – que bem mais tarde inspiraria a Ópera do Malandro, do brasileiro Chico Buarque de Holanda – e Ascensão e Queda da Cidade de Mahagonny (1930), escritos em colaboração com o compositor Kurt Weil. A crítica social contida nessas obras e seu humor cínico causaram escândalo na República de Weimar alemã. A ascensão ao poder dos nazistas marcou o início de uma longa odisséia para Brecht, que, no final, o conduziu à Califórnia, onde permaneceu até o final da guerra e onde escreveu muitas das suas famosas obras teatrais: Galileu Galilei (1938), que aborda a responsabilidade da ciência, dando três pontos de vista distintos nas suas três versões; a peça antibelicista Mãe Coragem (1939); A Boa Pessoa de Setzuan (1941). Em colaboração com Lion Feuchtwanger, em As Visões de Simone Machard, transportou para a época da Segunda Guerra Mundial o mito de Joana d´Arc, personagem que já tinha abordado em 1930 em Santa Joana dos Matadouros, que só estreou em 1959. A obra contra Hitler, A Ascensão Irresistível de Arturo Ui, escrita no exílio na Finlândia, em 1941, só estreou depois da morte de Brecht. Após o regresso à Alemanha Oriental, fundou –- e, a partir de 1949, dirigiu, conjuntamente com sua mulher –- o Berliner Ensemble, onde se encenavam principalmente suas obras. Tal como as peças de teatro, a obra lírica de Brecht, publicada em quatro coleções, contém uma importante carga de crítica política e de ironia, embora também tenha composto poemas de amor muito pessoais. São especialmente conhecidas as Histórias do Sr. Keuner, coleção de breves episódios, que escreveu desde 1930 até a sua morte e foi publicada em 1958.Ajude a deixar este site mais completo, compartilhe seu conhecimento.
Textos
Bertold Brecht
Poemas de Bertold Brecht
Os que lutam
"Há aqueles que lutam um dia; e por isso são muito bons;
Há aqueles que lutam muitos dias; e por isso são muito bons;
Há aqueles que lutam anos; e são melhores ainda;
Porém há aqueles que lutam toda a vida; esses são os imprescindíveis."
O Analfabeto Político:
O pior analfabeto é o analfabeto político.
Ele não ouve, não fala, nem participa dos acontecimentos políticos.
Ele não sabe que o custo de vida, o preço do feijão,
do peixe, da farinha, do aluguel, do sapato e do remédio
dependem das decisões políticas.
O analfabeto político é tão burro que se orgulha e estufa o peito dizendo que odeia
a política. Não sabe o imbecil que da sua ignorância política nasce a prostituta,
o menor abandonado, e o pior de todos os bandidos que é o político vigarista,
pilantra, o corrupto e lacaio dos exploradores do povo.
Nada é impossível de Mudar :
"Desconfiai do mais trivial, na aparência singelo.
E examinai, sobretudo, o que parece habitual.
Suplicamos expressamente: não aceiteis o que é de
hábito como coisa natural, pois em tempo de desordem
sangrenta, de confusão organizada, de arbitrariedade consciente,
de humanidade desumanizada, nada deve parecer natural
nada deve parecer impossível de mudar."
Privatizado
"Privatizaram sua vida, seu trabalho, sua hora de amar e seu direito de pensar.
É da empresa privada o seu passo em frente,
seu pão e seu salário. E agora não contente querem
privatizar o conhecimento, a sabedoria,
o pensamento, que só à humanidade pertence."
SOBRE A VIOLÊNCIA
A corrente impetuosa é chamada de violenta
Mas o leito do rio que a contem
Ninguém chama de violento.
A tempestade que faz dobrar as betulas
É tida como violenta
E a tempestade que faz dobrar
Os dorsos dos operários na rua?
DAS ELEGIAS DE BUCKOW
Viesse um vento
Eu poderia alçar vela.
Faltasse vela
Faria uma de pano e pau. FERRO.
No sonho esta noite
Vi um grande temporal.
Ele atingiu os andaimes
Curvou a viga
A feita de ferro.
Mas o que era de madeira
Dobrou-se e ficou.
SE FÔSSEMOS INFINITOS
Fossemos infinitos
Tudo mudaria
Como somos finitos
Muito permanece.
QUEM SE DEFENDE
Quem se defende porque lhe tiram o ar
Ao lhe apertar a garganta, para este há um parágrafo
Que diz: ele agiu em legitima defesa. Mas
O mesmo parágrafo silencia
Quando vocês se defendem porque lhes tiram o pão.
E no entanto morre quem não come, e quem não come o suficiente
Morre lentamente. Durante os anos todos em que morre
Não lhe é permitido se defender.
PERGUNTAS DE UM TRABALHADOR QUE LÊ
Quem construiu a Tebas de sete portas?
Nos livros estão nomes de reis.
Arrastaram eles os blocos de pedra?
E a Babilônia varias vezes destruída--
Quem a reconstruiu tanta vezes? Em que casas
Da Lima dourada moravam os construtores?
Para onde foram os pedreiros, na noite em que
a Muralha da China ficou pronta?
A grande Roma esta cheia de arcos do triunfo
Quem os ergueu? Sobre quem
Triumfaram os Cesares? A decantada Bizancio
Tinha somente palácios para os seus habitantes? Mesmo
na lendária Atlântida
Os que se afogavam gritaram por seus escravos
Na noite em que o mar a tragou.
O jovem Alexandre conquistou a Índia.
Sozinho?
César bateu os gauleses.
Não levava sequer um cozinheiro?
Filipe da Espanha chorou, quando sua Armada
Naufragou. Ninguém mais chorou?
Frederico II venceu a Guerra dos Sete Anos.
Quem venceu alem dele?
Cada pagina uma vitoria.
Quem cozinhava o banquete?
A cada dez anos um grande Homem.
Quem pagava a conta?
Tantas histórias.
Tantas questões.
EU SEMPRE PENSEI
E eu sempre pensei: as mais simples palavras
Devem bastar. Quando eu disser como é
O coração de cada um ficara dilacerado.
Que sucumbiras se não te defenderes
Isso logo veras.
NÃO NECESSITO DE PEDRA TUMULAR
Não necessito de pedra tumular, mas
Se necessitarem de uma para mim
Gostaria que nela estivesse:
Ele fez sugestões
Nós as aceitamos.
Por tal inscrição
Estaríamos todos honrados.
LENDO HORACIO
Mesmo o diluvio
Não durou eternamente.
Veio o momento em que
As águas negras baixaram.
Sim, mas quão poucos
Sobreviveram!
EPITÁFIO PARA GORKI
Aqui jaz
O enviado dos bairros da miséria
O que descreveu os atormentadores do povo
E aqueles que os combateram
O que foi educado nas ruas
O de baixa extração
Que ajudou a abolir o sistema de Alto a Baixo
O mestre do povo
Que aprendeu com o povo.
NA MORTE DE UM COMBATENTE DA PAZ
À memória de Carl von Ossietzky
Aquele que não cedeu
Foi abatido
O que foi abatido
Não cedeu.
A boca do que preveniu
Está cheia de terra.
A aventura sangrenta
Começa.
O túmulo do amigo da paz
É pisoteado por batalhões.
Então a luta foi em vão?
Quando é abatido o que não lutou só
O inimigo
Ainda não venceu.
A MÁSCARA DO MAL
Em minha parede há uma escultura de madeira japonesa
Máscara de um demônio mau, coberta de esmalte dourado
Copreensivo observo
As veias dilatadas da fronte, indicando
Como é cansativo ser mal
REFLETINDO SOBRE O INFERNO
Refletindo, ouço dizer, sobre o inferno
Meu irmão Shelley achou ser ele um lugar
Mais ou menos semelhante a Londres. Eu
Que não vivo em Londres, mas em Los Angeles
Acho, refletindo sobre o inferno, que ele deve
Assemelhar-se mais ainda a Los Angeles.
Também no inferno
Existem, não tenho dúvidas, esses jardins luxuriantes
Com as flores grandes como árvores, que naturalmente fenecem
Sem demora, se não são molhadas com água muito cara.
E mercados de frutas
Com verdadeiros montes de frutos,no entanto
Sem cheiro nem sabor.E intermináveis filas de carros
Mais leves que suas próprias sombras,mais rápidos
Que pensamentos tolos,autómoveis reluzentes,nos quais
Gente rosada,vindo de lugar nenhum,vai a nenhum lugar.
E casas construídas para pessoas felizes,portanto vazias
Mesmo quando habitadas.
Também as casas do inferno não são todas feias
Mas a preocupacão de serem lançados na rua
Consome os moradortes das mansões nao menos que
Os moradores do barracos.
NA GUERRA MUITAS COISAS CRESCERÃO
Ficarão maiores
As propriedades dos que possuem
E a miséria dos que não possuem
As falas do guia*
E o silêncio dos guiados.
* FührerCOMO BEM SEI
Como bem sei
Os impuros viajam para o inferno
Através do céu inteiro.
São levados em carruagens transparentes:
Isto embaixo de vocês, lhe dizem
É o céu.
Eu sei que lhes dizem isso
Pois imagino
Que justamente entre eles
Há muitos que não o reconheceriam, pois eles
Precisamente
Imaginavam-no mais radiante
JAMAIS TE AMEI TANTO
Jamais te amei tanto, ma soeur
Como ao te deixar naquele pôr do sol
O bosque me engoliu, o bosque azul, ma soeur
Sobre o qual sempre ficavam as estrelas pálidas
No Oeste.
Eu ri bem pouco, não ri, ma soeur
Eu que brincava ao encontro do destino negro -
Enquanto os rostos atrás de mim lentamente
Iam desaparecendo no anoitecer do bosque azul.
Tudo foi belo nessa tarde única, ma soeur
Jamais igual, antes ou depois -
É verdade que me ficaram apenas os pássaros
Que à noite sentem fome no negro céu.
A MINHA MÃE
Quando ela acabou, foi colocada na terra
Flores nascem, borboletas esvoejam por cima...
Ela, leve, não fez pressão sobre a terra
Quanta dor foi preciso para que ficasse tão leve!
TAMBÉM O CÉU
Também o céu às vezes desmorona
E as estrelas caem sobre a terra
Esmagando-a com todos nós.
Isto pode ser amanhã.
O NASCIDO DEPOIS
Eu confesso: eu
Não tenho esperança.
Os cegos falam de uma saída. Eu Vejo.
Após os erros terem sido usados
Como última companhia, à nossa frente
Senta-se o Nada.
EPÍSTOLA SOBRE O SUICÍDIO
Matar-se
É coisa banal.
Pode-se conversar com a lavadeira sobre isso.
Discutir com um amigo os prós e os contras.
Um certo pathos, que atrai
Deve ser evitado.
Embora isto não precise absolutamente ser um dogma.
Mas melhor me parece, porém
Uma pequena mentira como de costume:
Você está cheio de trocar a roupa de cama, ou melhor
Ainda:
Sua mulher foi infiel
(Isto funciona com aqueles que ficam surpresos com essas coisas
E não é muito impressionante)
De qualquer modo
Não deve parecer
Que a pessoa dava
Importância demais a si mesmo
UM HOMEM PESSIMISTA
Um homem pessimista
É tolerante.
Ele sabe deixar a fina cortesia desmanchar-se na língua
Quando um homem não espanca uma mulher
E o sacrifício de uma mulher que prepara café para seu amado
Com pernas brancas sob a camisa -
Isto o comove.
Os remorsos de um homem que
Vendeu o amigo
Abalam-no, a ele que conhece a frieza do mundo
E como é sábio
Falar alto e convencido
No meio da noite.
SOUBE
Soube que
Nas praças dizem de mim que durmo mal
Meus inimigos, dizem, já estão assentando casa
Minhas mulheres põem seus vestidos bons
Em minha ante-sala esperam pessoas
Conhecidas como amigas dos infelizes.
Logo
Ouvirão que não como mais
Mas uso novos ternos
Mas o pior é: eu mesmo
Observo que me tornei
Mais duro com as pessoas.
QUEM NÃO SABE DE AJUDA
Como pode a voz que vem das casas
Ser a da justiça
Se os pátios estão desabrigados?
Como pode não ser um embusteiro aquele que
Ensina os famintos outras coisas
Que não a maneira de abolir a fome?
Quem não dá o pão ao faminto
Quer a violência
Quem na canoa não tem
Lugar para os que se afogam
Não tem compaixão.
Quem não sabe de ajuda
Que cale.
ACREDITE APENAS
Acredite apenas no que seus olhos vêem e seus ouvidos
Ouvem!
Também não acredite no que seus olhos vêem e seus
Ouvidos ouvem!
Saiba também que não crer algo significa algo crer!
COM CUIDADO EXAMINO
Com cuidado examino
Meu plano: ele é
Grande, ele é
Irrealizável.
OS ESPERANÇOSOS
Pelo que esperam?
Que os surdos se deixem convencer
E que os insaciáveis
Lhes devolvam algo?
Os lobos os alimentarão, em vez de devorá-los!
Por amizade
Os tigres convidarão
A lhes arrancarem os dentes!
É por isso que esperam!
NO SEGUNDO ANO DE MINHA FUGA
No segundo ano de minha fuga
Li em um jornal, em língua estrangeira
Que eu havia perdido minha cidadania.
Não fiquei triste nem alegre
Ao ver meu nome entre muitos outros
Bons e maus.
A sina dos que fugiam não me pareceu pior
Do que a sina dos que ficavam.
PARA LER DE MANHÃ E À NOITE
Aquele que amo
Disse-me
Que precisa de mim.
Por isso
Cuido de mim
Olho meu caminho
E receio ser morta
Por uma só gota de chuva.
DE QUE SERVE A BONDADE
1
De que serve a bondade
Se os bons são imediatamente liquidados, ou são liquidados
Aqueles para os quais eles são bons?
De que serve a liberdade
Se os livres têm que viver entre os não-livres?
De que serve a razão
Se somente a desrazão consegue o alimento de que todos necessitam?
2
Em vez de serem apenas bons, esforcem-se
Para criar um estado de coisas que torne possível a bondade
Ou melhor: que a torne supérflua!
Em vez de serem apenas livres, esforcem-se
Para criar um estado de coisas que liberte a todos
E também o amor à liberdade
Torne supérfluo!
Em vez de serem apenas razoáveis, esforcem-se
Para criar um estado de coisas que torne a desrazão de um indivíduo
Um mau negócio.
A Cruz de Giz
Eu sou uma criada. Eu tive um romance
Com um homem que era da SA.
Um dia, antes de ir
Ele me mostrou, sorrindo, como fazem
Para pegar os insatisfeitos.
Com um giz tirado do bolso do casaco
Ele fez uma pequena cruz na palma da mão.
Ele contou que assim, e vestido à paisana
anda pelas repartições do trabalho
Onde os empregados fazem fila e xingam
E xinga junto com eles, e fazendo isso
Em sinal de aprovação e solidariedade
Dá um tapinha nas costas do homem que xinga
E este, marcado com a cruz branca
é apanhado pela SA. Nós rimos com isso.
Andei com ele um ano, então descobri
Que ele havia retirado dinheiro
Da minha caderneta de poupança.
Havia dito que a guardaria para mim
Pois os tempos eram incertos.
Quando lhe tomei satisfações, ele jurou
Que suas intenções eram honestas. Dizendo isso
Pôs a mão em meu ombro para me acalmar.
Eu corri, aterrorizada. Em casa
Olhei minhas costas no espelho, para ver
Se não havia uma cruz branca.
As margens
Do rio que tudo arrasta se
diz que é violento
Mas ninguém diz violentas as
margens que o comprimem
O Vosso tanque General, é um carro forte
Derruba uma floresta esmaga cem
Homens,
Mas tem um defeito
- Precisa de um motorista
O vosso bombardeiro, general
É poderoso:
Voa mais depressa que a tempestade
E transporta mais carga que um elefante
Mas tem um defeito
- Precisa de um piloto.
O homem, meu general, é muito útil:
Sabe voar, e sabe matar
Mas tem um defeito-
Sabe pensar
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