Saber esperar
Saber esperar é algo tão difícil, que os maiores escritores não desdenharam fazer disso um tema de suas criações. Assim fizeram Shakespeare em Otelo e Sófocles em Ajax; se este tivesse deixado o sentimento esfriar por um dia apenas, seu suicídio já não lhe teria parecido necessário, como indica a fala do oráculo; provavelmente teria zombado das terríveis insinuações da vaidade ferida e teria dito a si mesmo: quem, no meu lugar, já não tomou unia ovelha por um herói? será uma coisa tão monstruosa? Pelo contrário, é algo humano e comum; dessa forma Ajax poderia se consolar. A paixão não quer esperar; o trágico na vida de grandes homens está, freqüentemente, não no seu conflito com a época e a baixeza de seus semelhantes, mas na sua incapacidade de adiar por um ou dois anos a sua obra; eles não sabem esperar. - Em todos os duelos, os amigos que dão conselhos devem verificar apenas uma coisa: se as pessoas envolvidas podem esperar; se este não for o caso, um duelo é razoável, pois cada um diz a si mesmo: "Ou eu continuo a viver, e então ele deve morrer imediatamente, ou o contrário". Em tal caso, esperar significaria sofrer por muito tempo ainda o horrendo martírio da honra ferida, diante de quem a feriu; o que pode constituir mais sofrimento do que o que vale a própria vida.
A esperança
Pandora trouxe o vaso que continha os males e o abriu. Era o presente dos deuses aos homens, exteriormente um presente belo e sedutor, denominado "vaso da felicidade". E todos os males, seres vivos alados, escaparam voando: desde então vagueiam e prejudicam os homens dia e noite. Um único mal ainda não saíra do recipiente: então, seguindo a vontade de Zeus, Pandora repôs a tampa, e ele permaneceu dentro. O homem tem agora para sempre o vaso da felicidade, e pensa maravilhas do tesouro que nele possui; este se acha à sua disposição: ele o abre quando quer; pois não sabe que Pandora lhe trouxe o recipiente dos males, e para ele o mal que restou é o maior dos bens - é a esperança. - Zeus quis que os homens, por mais torturados que fossem pelos outros males, não rejeitassem a vida, mas continuassem a se deixar torturar. Para isso lhes deu a esperança: ela é na verdade o pior dos males, pois prolonga o suplício dos homens. Friedrich Nietzsche, "Humano, demasiado humano"
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